Parecia uma noite qualquer, um fim de inverno que antecede a
primavera. Eu e três amigos estávamos voltando de uma festa, uma noite
clara com lua cheia e clima confortável, duas horas da madrugada, apesar
do cheiro de bebidas e o desconforto da possível ressaca do dia
seguinte, tudo perecia bem. Em um opala preto, quatro portas, ano 78
seguíamos pela via Estrutural, pista que dá acesso à DF 001 para
Brazlândia. Quando entramos na DF 001 sentimos um alívio que acontece
quando estamos no caminho certo para chegar em casa e descansar. A
sonolência e o cansaço tomavam conta de todos, tentei não adormecer para
garantir nossa chegada sem acidente. Quando passamos próximo ao Parque
Nacional de Brasília, no quilômetro 90 da DF 001, o tempo começou a
ganhar um aspecto diferente, começou a ficar nebuloso e a esfriar.
Quanto mais andávamos mais o tempo se fechava e a neblina ficava mais
densa, o frio parecia não ser real para o mês, porque próximo
à primavera o calor é predominante nessa região.
Quando começamos a nos aproximar da BR 080 onde fica a "Curva da
Morte", a neblina era tão intensa que não víamos quase nada. Achei
estranho e tentei acordar os bêbados sonolentos que estavam comigo. Após
uns sacolejos, Vila acordou assustado com a escuridão, preocupado
sacolejou Zete, este com os olhos esbugalhados com a escuridão que se
encontrava ficou em pavor. Zete tentou acordar Tiele que se encontrava
no banco de trás, mas este só encostou-se na porta lateral do carro e
ficou em seu sono profundo. Com a intensidade da neblina, o medo foi
tomando conta da gente, acelerei o máximo para tentar sair da escuridão,
mas não podia arriscar. A neblina ficava cada vez mais densa e parecia
que a gente não saia do lugar. Quando chegamos próximo à curva, apareceu
um foco de luz dentro da neblina e esta nos guiou. Quando chegamos
perto, em meio a luz tinha um vulto de uma pessoa.
A luz ficava em sua volta, era brilhante e quanto mais a gente se
aproximava mais claro ficava em meio à neblina, e o vulto ficava mais
nítido. Não tinha controle sobre a velocidade do carro, pois estávamos
indo direto para a luz sem qualquer domínio. Quando o vulto foi ficando
nítido, observamos que se tratava de uma mulher, o brilho em sua volta
mostrava que estava com um vestido branco, com detalhes em renda,
um vestido que não se encontra em loja, vestido de noiva feito por
encomenda, coisa de tia ou mãe caprichosa para um casamento especial.
Cada vez mais próximo, o medo tomava conta, o arrepio dos cabelos, o
frio tocava os ossos, olhos esbugalhados, sem palavras, só olhares
tensos e assustados. Em um movimento lento a mulher levantou a mão, como
se pedisse para parar, ficamos sem saber o que fazer: Parar? Tentar
acelerar? Sair dali de qualquer forma?... Havia poucos segundos para
tomar a decisão. Mas qual?
Ao ficar diante da tal mulher, esta levantou a cabeça, seu rosto
apareceu entre seus cabelos longos e pretos, mostrando seus olhos
grandes e tristes e os fixou em nossa direção. O que fazer? Como fazer?
Qual a saída? O medo era enorme, a neblina intensa, o frio, o arrepio,
movimentos limitados como se ficasse preso na tristeza dos olhos dela,
tudo girava, tudo acontecia em segundos, em um movimento de alta defesa
ou de reação instantânea consegui continuar acelerando o carro,
passamos da mulher, mas o carro não conseguia desenvolver velocidade. Em
certo momento sentimos que a deixamos para trás, mas quando olhei pelo
espelho interno do carro ela estava sentada no banco de trás, entre meus
amigos, de braços abertos como se fosse abraçá-los, gritei tentando
avisá-los, mas parecia que eles não a viam. Meu amigo do banco de
passageiro conseguia vê-la e tentava pular do carro, eu tentava puxá-lo
de volta.
Por instantes o desespero tomou conta de todos nós, até o sonolento
acordou procurando o que estava acontecendo e começou a falar coisa com
coisa. Suas palavras estranhas saiam sem controle: “Quando passar
por aqui sempre dê carona quando solicitado, nunca deixe alguém na
beira da estrada no frio”, “Se não parar eu entrarei e seguirei viagem, é
só olhar o espelho interno que estarei em sua companhia”, “Se parar
poderá seguir viagem em paz, pois considero uma carona”.
De repente saímos da neblina, o céu estava claro com uma lua enorme e
muitas estrelas, o tempo voltou ao normal e o clima confortável. Tudo
estava como antes, menos meus amigos que estavam com uma expressão de
que nada tinha acontecido, tentei falar sobre o assunto, mas nada os
faziam lembrar-se do ocorrido, apenas diziam: "Você bebeu muito e ainda
confiamos você dirigindo. Isto que nos deixa com medo".
Muitas são as histórias da curva da morte, acidentes, carros saindo
da estrada, sonolência repentina, neblina, aparições de animais
repentinamente na pista... mas o que é estranho, é que todos os
envolvidos nos acidentes esquecem o que realmente aconteceu ou não sabem
quem causou o acidente. Então, ao passar nestas rodovias que se
encontram na curva da morte, fiquem atentos entre a DF 001 km 90 e a
BR 080 km 02. São em noites enluaradas, ou às vezes chuvosas, quentes ou
frias. Não tem uma noite determinante em si, somente o inesperado. E
que todos tenham uma única certeza: isto ainda não parou de acontecer.
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